Crédito, Getty Images
-
- Author, Mark Savage
- Role, Correspondente de música da BBC News
Se você tivesse visto o primeiro show do Black Sabbath, não teria reconhecido a grandiosidade da banda.
Em 1968, eles tinham um nome decididamente menos sinistro, The Polka Tulk Blues Band, e contavam com um saxofonista e um guitarrista que usava “bottleneck” (técnica que desliza um cilindro sobre as cordas da guitarra) para tocar.
Um ano depois, eles diminuíram de tamanho, encontraram um novo nome e inventaram o heavy metal. Poucas bandas estão tão intrinsecamente ligadas a um gênero musical, mas o Sabbath estabeleceu o modelo para todos, desde Motörhead e AC/DC até Metallica e Guns ‘n’ Roses.
Ao longo do caminho, o vocalista Ozzy Osbourne, que morreu aos 76 anos, se tornou uma das figuras mais influentes do rock, com uma presença de palco eletrizante e imprevisível e um consumo de drogas quase mitológico.
“Se alguém viveu o estilo de vida libertino do rock ‘n’ roll”, ele admitiu certa vez, “acho que fui eu”.
Mas, afinal, como esses quatro músicos da classe trabalhadora de Aston, em Birmingham, na Inglaterra, reescreveram as regras do rock?
Crédito, Getty Images
De acordo com Osbourne, foi uma reação visceral às músicas “hippies” como San Francisco (Be Sure to Wear Some Flowers In Your Hair) que saturaram as ondas de rádio após o Verão do Amor de 1967.
“Flores no seu cabelo? Faça-me um favor”, se revoltou o músico em sua autobiografia de 2010.
“As únicas flores que alguém via em Aston eram aquelas que você jogava no buraco depois que você morria aos 53 anos, porque tinha trabalhado até a morte.”
Juntando-se ao guitarrista Tony Iommi, ao baixista Geezer Butler e ao baterista Bill Ward, a ideia inicial de Osbourne era dar um toque “brummie” (relativo a Birmingham) ao som de blues do Fleetwood Mac.
O primeiro nome da banda, Polka Tulk, foi inspirado em uma marca de talco que sua mãe usava.
Depois de abandonar o saxofone, eles mudaram o nome para Earth, fazendo o máximo de shows que conseguiam e até mesmo conseguindo alguns extras.
“Sempre que uma banda de renome chegava à cidade, colocávamos todas as nossas coisas na van e esperávamos do lado de fora do local, na esperança de que eles não aparecessem”, lembrou Osbourne mais tarde.
E deu certo… mas apenas uma vez, quando a banda foi convidada a substituir o Jethro Tull que não apareceu. “Depois disso, todos os organizadores sabiam nosso nome”, disse Ozzy.
Crédito, Getty Images
Essa veia oportunista também os direcionou para seu som característico.
O espaço de ensaio da banda ficava em frente a um cinema que exibia filmes de terror à noite.
Observando o público que lotava essas sessões, a banda elaborou um plano.
“Tony disse: “Você não acha estranho como as pessoas pagam para se assustar? Por que não começamos a escrever músicas de terror?”, contou Osbourne ao jornalista musical Pete Paphides em 2005. “E foi isso que aconteceu.”
Os músicos se metamorfosearam em sua forma final — adotando o nome Black Sabbath, em homenagem a um filme homônimo de baixo orçamento de Boris Karloff, eles começaram a escrever letras que tratavam de morte, magia negra e transtornos mentais.
Para se adequar ao conteúdo, a música também precisava ficar mais pesada. Ward diminuiu o ritmo. Iommi aumentou o volume. Osbourne desenvolveu um vocal agressivo que parecia estar sempre à beira da insanidade.
Mas foi a guitarra de Iommi que realmente diferenciou o Sabbath. Seus riffs saltavam do amplificador e atingiam o público em cheio no peito com força.
Foi um som que ele desenvolveu por necessidade.
Aos 17 anos, Iommi estava trabalhando em uma fábrica de chapas metálicas quando perdeu as pontas dos dois dedos médios em um acidente de trabalho.
Embora os cirurgiões tenham tentado reimplantá-las, elas haviam ficado pretas quando ele chegou ao hospital. Parecia ser o fim de sua carreira como guitarrista.
“Os médicos disseram: ‘A melhor coisa que você tem a fazer é desistir, de verdade. Arrume outro emprego, faça outra coisa'”, escreveu Iommi em sua autobiografia, Iron Man.
Determinado a provar que eles estavam errados, ele derreteu um frasco de detergente para fazer dedais protetores para seus dedos, e afrouxou as cordas para não ter que aplicar muita pressão no braço da guitarra para criar uma nota.
Depois de meses de prática dolorosa, ele aprendeu um novo estilo de tocar — usando seus dois dedos bons para fazer acordes, e adicionando vibrato para engrossar o som.
Esse rugido despojado e desafinado se tornou a base do heavy metal.
“Eu nunca tinha ouvido esse estilo de tocar”, contou Tom Allan, que foi o engenheiro de som do álbum de estreia homônimo do Sabbath em 1969.
“Eu realmente não conseguia entender. Realmente não entendia. Você nunca ouvia nada parecido no rádio.”
Crédito, Getty Images
‘Missa satânica’
O disco era sombrio e pesado – em parte porque a banda o havia gravado em apenas dois dias, com recursos limitados.
Os críticos não tinham certeza do que pensar a respeito. Escrevendo na revista Rolling Stone, Lester Bangs disse que o álbum havia sido “exaltado como uma celebração ritualística de rock da missa satânica ou alguma bobagem do tipo… Eles não são tão ruins, mas esse é todo o crédito que se pode dar a eles”.
As imagens supostamente satânicas provocaram um pânico moral na grande imprensa, que se intensificou quando se descobriu que a faixa-título do álbum continha uma progressão de acordes conhecida como Intervalo do Diabo, que havia sido banida pela igreja na Idade Média.
O que a imprensa não percebeu foi que Black Sabbath, a música, havia sido escrita como uma advertência sobre os perigos do satanismo, depois que Ward adormeceu lendo livros sobre ocultismo e acordou vendo uma figura fantasmagórica encapuzada parada no pé da sua cama.
“Isso me assustou pra caramba”, lembrou ele mais tarde.
Seja qual for a verdade, a polêmica vendeu discos e atraiu legiões de fãs.
Certa vez, a banda voltou para o hotel e encontrou 20 satanistas vestidos de preto segurando velas e cantando do lado de fora do seu quarto. Para se livrar deles, Osbourne apagou as velas e cantou parabéns.
Crédito, Getty Images
Ainda assim, o Sabbath abraçou sua reputação, escrevendo conteúdo sombrio e ganhando fama de “encrenqueiro” com o passar dos anos 1970.
Mas a música nunca foi tão básica ou unidimensional como sua imagem sugeria.
Seu segundo álbum, Paranoid, marcou um salto sísmico na composição, desde o hino visceral contra a guerra War Pigs até a intensidade progressiva da faixa-título, passando pelo horror de ficção científica de Iron Man e a balada fantasmagórica de Planet Caravan.
Eles mantiveram o ritmo em Master of Reality, de 1971, com Osbourne descrevendo Children Of The Grave como “a música mais espetacular que já havíamos gravado”.
Vol. 4, lançado em 1972, às vezes é ignorado por não ter um grande single de rádio, mas também contém alguns dos melhores e mais variados trabalhos da banda.
Snowblind documenta seu mergulho nas drogas com um riff de guitarra profundo; enquanto St Vitus’ Dance é um conselho surpreendentemente terno para um amigo com o coração partido; e Laguna Sunrise é um instrumental bucólico.
Sabbath Bloody Sabbath, por sua vez, foi escrita como uma crítica furiosa a uma indústria musical que os havia descartado.
“The people who have crippled you / You want to see them burn”, diz um trecho da música, que pode ser traduzido como:
“As pessoas que acabaram com você / Você quer que elas queimem.”
Depois de 55 anos, e centenas de imitadores, o choque inicial do som do Sabbath diminuiu. De que outra forma você explica Osbourne e Iommi tocando Paranoid no Jubileu de Ouro da rainha Elizabeth 2ª em 2002?
Mas a força dessas músicas, desde os riffs alucinantes de Iommi até o lamento vocal insistente de Osbourne, é indelével.
Quando apresentou o Black Sabbath no Hall da Fama do Rock and Roll, Lars Ulrich, do Metallica, afirmou: “Se não houvesse o Black Sabbath, o hard rock e o heavy metal seriam muito diferentes”.
“Quando se trata de definir um gênero dentro do mundo da música pesada”, ele disse, “o Sabbath é único”.
Escrevendo após o penúltimo show de despedida da banda em 2017, Osbourne afirmou que se sentia honrado pelo reconhecimento.
“Nunca sonhei que estaríamos aqui 49 anos depois”, ele disse.
“Mas quando penso em tudo isso, a melhor coisa de estar no Black Sabbath depois de todos esses anos é que a música se manteve.”
Cinco músicas essenciais de Ozzy Osbourne
Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimos sua autorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a política de uso de cookies e os termos de privacidade do Google YouTube antes de concordar. Para acessar o conteúdo clique em “aceitar e continuar”.
Alerta: A BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos YouTube conteúdo pode conter propaganda.
Final de YouTube post, 1
Conteúdo não disponível
Veja mais em YouTubeA BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos.
Ao escrever na última hora uma música para tapar buraco em seu segundo álbum, o Black Sabbath criou acidentalmente seu maior sucesso: a história de um homem lutando contra suas vozes interiores, ao som de um dos riffs mais poderosos do rock.
“De vez em quando, surge uma música do nada”, disse Osbourne. “É um presente.”
Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimos sua autorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a política de uso de cookies e os termos de privacidade do Google YouTube antes de concordar. Para acessar o conteúdo clique em “aceitar e continuar”.
Alerta: A BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos YouTube conteúdo pode conter propaganda.
Final de YouTube post, 2
Conteúdo não disponível
Veja mais em YouTubeA BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos.
A música que lançou a carreira solo de Osbourne é quase atipicamente otimista, ignorando a paranoia da Guerra Fria e declarando: “Maybe it’s not too late to learn how to love.”
“Talvez não seja tarde demais para aprender a amar”, em tradução livre.
Somente a risada maníaca nos compassos finais que sugere que essa perspectiva é de um louco.
Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimos sua autorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a política de uso de cookies e os termos de privacidade do Google YouTube antes de concordar. Para acessar o conteúdo clique em “aceitar e continuar”.
Alerta: A BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos YouTube conteúdo pode conter propaganda.
Final de YouTube post, 3
Conteúdo não disponível
Veja mais em YouTubeA BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos.
3) Sabbath Bloody Sabbath
A reputação sombria do Sabbath fez com que suas capacidades melódicas fossem frequentemente ignoradas. Mas Osbourne era um admirador apaixonado dos Beatles, e é possível ouvir a influência deles no refrão pastoral dessa música, antes de Tony Iommi entrar com uma linha de guitarra gutural.
John Lennon, sem dúvida, teria aprovado a crítica fervorosa de Osbourne à indústria musical, resumida no verso: “Bog blast all of you.”
“Danem-se todos vocês”, em tradução livre.
Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimos sua autorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a política de uso de cookies e os termos de privacidade do Google YouTube antes de concordar. Para acessar o conteúdo clique em “aceitar e continuar”.
Alerta: A BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos YouTube conteúdo pode conter propaganda.
Final de YouTube post, 4
Conteúdo não disponível
Veja mais em YouTubeA BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos.
O Sabbath revelou seu lado mais sensível nessa balada de piano de 1972, que fala sobre o término de relacionamento que o baterista Bill Ward estava vivendo.
“Eu achei a música brilhante desde o momento em que a gravamos pela primeira vez”, disse Osbourne, que mais tarde a retrabalhou como um dueto com a filha, Kelly, e alcançou o primeiro lugar nas paradas do Reino Unido na semana anterior ao Natal de 2003.
Este item inclui conteúdo extraído do Google YouTube. Pedimos sua autorização antes que algo seja carregado, pois eles podem estar utilizando cookies e outras tecnologias. Você pode consultar a política de uso de cookies e os termos de privacidade do Google YouTube antes de concordar. Para acessar o conteúdo clique em “aceitar e continuar”.
Alerta: A BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos YouTube conteúdo pode conter propaganda.
Final de YouTube post, 5
Conteúdo não disponível
Veja mais em YouTubeA BBC não se responsabiliza pelo conteúdo de sites externos.
Inspirada no notório ocultista Aleister Crowley, essa faixa do álbum Blizzard of Ozz, de 1980, permitiu que Osbourne fizesse jus à sua imagem satânica.
Mas também o ajudou a escapar da sombra do Black Sabbath, com um som pesado e psicodélico, finalizado por um solo explosivo do seu novo parceiro, o mestre da guitarra Randy Rhoads.
Ouça também: War Pigs e Iron Man são clássicos de todos os tempos, enquanto Diary of a Madman e Suicide Solution são capítulos cruciais do repertório solo de Osbourne. Vale conferir ainda Patient Number 9, a faixa-título do seu último álbum, que encerrou sua carreira em grande estilo.