Crédito, Getty Images
-
- Author, Giulia Granchi
- Role, Da BBC News Brasil em Londres
Apesar do descumprimento, Moraes classificou o episódio como uma “irregularidade isolada” e optou por não converter as restrições em prisão preventiva — ao menos por enquanto.
A advertência ocorreu no âmbito dos embargos de declaração apresentados pela defesa de Bolsonaro na Ação Penal 2.668, que tramita no STF. O ex-presidente é acusado de tentar obstruir a Justiça e incitar interferências estrangeiras em investigações, entre outros crimes, como coação no curso do processo e atentado à soberania nacional.
Segundo Moraes, ficou comprovado que as redes sociais de Eduardo Bolsonaro — também investigado — foram utilizadas para divulgar um discurso do pai, veiculado logo após sua gravação, configurando burla à proibição de uso de mídias digitais, mesmo que por intermédio de terceiros. Essa conduta, escreveu o ministro, “se alinha ao ilícito modus operandi já descrito” e demonstra a tentativa de driblar as restrições impostas pela Corte.
“O investigado não pode se valer das redes sociais de terceiros para retransmitir ou promover entrevistas, discursos ou vídeos com o objetivo de manter práticas que estão sendo apuradas judicialmente”, reforçou Moraes, ao lembrar que o STF já condenou diversos réus por integrarem “milícias digitais” voltadas à desinformação e ao ataque às instituições democráticas.
As restrições foram definidas pela Primeira Turma do STF em 18 de julho, com referendo da decisão em sessão virtual extraordinária entre os dias 18 e 21.
Além da proibição de uso de redes sociais, diretamente ou por terceiros, Bolsonaro está impedido de deixar a comarca onde reside sem autorização, sendo monitorado por tornozeleira eletrônica e obrigado a cumprir recolhimento domiciliar noturno — das 19h às 6h em dias úteis, e integral nos fins de semana e feriados. Ele também está vetado de manter contato com embaixadores, autoridades estrangeiras e outros investigados.
Apesar de reconhecer a infração, Moraes ponderou que a defesa alegou não haver intenção de descumprir as ordens judiciais e destacou que Bolsonaro vem respeitando as demais regras impostas. O ministro advertiu, no entanto, que um novo episódio levará à decretação imediata da prisão preventiva, conforme o artigo 312 do Código de Processo Penal.
Na decisão, Moraes frisou que Bolsonaro não está proibido de conceder entrevistas ou discursar em público, desde que respeite os horários do recolhimento. O problema, segundo o ministro, surge quando esses conteúdos são “pré-fabricados” para posterior disseminação nas redes por grupos previamente coordenados.
Para o relator, permitir essa dinâmica equivaleria a permitir que “o investigado lavasse dinheiro usando contas de terceiros”.
As medidas restritivas
Moraes determinou uma série de medidas restritivas a Bolsonaro após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, usar o julgamento do STF contra o ex-presidente como justificativa para ameaçar o Brasil com tarifas comerciais.
Mandados de busca e apreensão foram cumpridos na casa de Bolsonaro, em Brasília, e em endereços ligados ao Partido Liberal (PL), partido ao qual o ex-presidente é filiado.
Entre as medidas determinadas por Moraes estão o recolhimento domiciliar de Jair Bolsonaro entre 19h e 6h de segunda a sexta-feira, além do confinamento integral aos fins de semana e feriados.
Além de usar tornozeleira eletrônica, o ex-presidente está proibido de manter contato com embaixadores ou autoridades estrangeiras, bem como de se aproximar de sedes de embaixadas e consulados.
As restrições foram solicitadas pela Polícia Federal (PF) e tiveram parecer favorável da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Em relatório, a Polícia Federal afirmou que Bolsonaro e o filho, o deputado Eduardo Bolsonaro, têm atuado nos últimos meses junto a autoridades do governo dos Estados Unidos com o objetivo de pedir sanções contra agentes públicos brasileiros, sob o argumento de perseguição relacionada à Ação Penal 2668, que tramita no STF.
De acordo com a PF, pai e filho teriam agido “dolosa e conscientemente de forma ilícita”, buscando “submeter o funcionamento do Supremo Tribunal Federal ao crivo de outro Estado estrangeiro, por meio de atos hostis derivados de negociações espúrias e criminosas, com patente obstrução à Justiça e clara finalidade de coagir essa Corte.”
Em entrevista à imprensa, Bolsonaro atribuiu motivação política à investigação que motivou a nova operação da PF. “Nunca pensei em sair do Brasil ou buscar refúgio em embaixada”, declarou.
O início do episódio ocorreu em 17 de julho, quando Trump enviou uma carta a Bolsonaro com críticas duras ao sistema de Justiça brasileiro.
“Eu vi o terrível tratamento que você está recebendo nas mãos de um sistema injusto voltado contra você. Este julgamento deve terminar imediatamente!”, escreveu Trump.
“Não estou surpreso em vê-lo liderando nas pesquisas; você foi um líder altamente respeitado e forte que serviu bem ao seu país.”
Antes, no dia 9 de julho, Trump publicou uma carta endereçada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciando que as exportações brasileiras sofrerão uma taxação adicional de 50% a partir do dia 1º de agosto.
Em tom duro, a carta diz que a decisão é uma resposta à perseguição que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria sofrendo no Brasil, devido ao processo criminal que enfrenta no Supremo, acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado.
Além disso, Trump também justificou o aumento de tarifa argumentando que o Brasil adota barreiras comerciais (tarifárias e não tarifárias) elevadas contra os EUA, o que estaria desequilibrando o comércio entre os dois países.
O governo brasileiro refuta essa argumentação, já que a balança comercial tem sido favorável aos Estados Unidos. O lado americano acumulou saldo positivo de US$ 43 bilhões nos últimos dez anos, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.