Campo Grande: A Pior Capital em Acesso à Cultura?


Campo Grande é a pior capital do país em acesso à cultura, aponta pesquisa
Público assistindo peça teatral no Circuito Comunidades do Campão Cultural em 2025 (Foto: Marithê do Céu)

Que o cenário cultural em Campo Grande estava longe do ideal não era novidade, mas a dimensão do problema surpreendeu até gestores da área nesta quarta-feira (20). A capital sul-mato-grossense recebeu o título de pior capital do Brasil em acesso à cultura, segundo levantamento realizado pelo Datafolha em parceria com a JL Cultura e Esporte.

Pesquisa Datafolha revela Campo Grande como a capital com pior acesso à cultura no Brasil. Levantamento feito em parceria com a JL Cultura e Esporte, entre abril e maio de 2025, entrevistou 600 pessoas e apontou baixos índices de participação em atividades como cinema, teatro, shows, museus e leitura. Idosos são os mais afetados pela falta de acesso. A capital sul-mato-grossense obteve as piores colocações em quase todos os 14 indicadores analisados. Apenas 12% dos entrevistados frequentaram teatro no último ano, enquanto 66% nunca visitaram um museu. A pesquisa também revelou que 70% das atividades culturais acontecem longe dos bairros dos moradores, dificultando a participação. Gestores culturais discutem a necessidade de políticas públicas para reverter esse cenário.

O estudo avaliou a participação da população em 14 atividades culturais, como cinema, teatro, shows de música, festas populares, museus, dança, circo, feiras de livro, saraus, concertos, bibliotecas, leitura de livros, jogos eletrônicos e exposições de arte ou históricas.

Campo Grande somou “14 medalhas negativas” no ranking nacional, liderando as piores posições em praticamente todos os indicadores. Entre os grupos mais prejudicados estão os idosos acima de 60 anos, apontados como a faixa etária com menor acesso à cultura no país.

Como foi feita a pesquisa

Os resultados foram apresentados no Museu da Imagem e do Som (MIS). Em Campo Grande, o levantamento entrevistou 600 pessoas em 60 pontos de grande fluxo, entre abril e maio de 2025, segundo o pesquisador João Leiva. A margem de erro é de quatro pontos percentuais.

A leitura de livros, por exemplo, registrou índice abaixo da média: apenas 47% dos campo-grandenses leram pelo menos um livro nos 12 meses anteriores. Bibliotecas (15%), teatro (12%), dança (15%), feiras de livro (9%), saraus (3%) e concertos (2%) também figuraram entre os piores acessos do país.

Na categoria jogos eletrônicos, só 34% declararam ter participado de eventos do tipo, colocando a capital novamente entre as últimas posições.

Comparação histórica

A JL Cultura já havia feito um estudo semelhante em Campo Grande em 2014. Na época, 564 pessoas foram entrevistadas. A comparação mostra queda em quase todas as atividades:

  • Shows (-19%)
  • Festas populares (-16%)
  • Circo (-12%)
  • Cinema (-11%)
  • Biblioteca (-9%)
Campo Grande é a pior capital do país em acesso à cultura, aponta pesquisa

Teatro e museus entre os piores índices

O teatro foi frequentado por apenas 12% dos entrevistados no último ano, e a maioria assistiu peças infantis (50%). Comédias e stand ups somaram 36%, e musicais, 24%. Entre os motivos para ir ao teatro, 40% apontaram lazer e diversão, 19% aprendizado, enquanto 25% citaram questões econômicas e 14% falta de tempo.

Museus e saraus também aparecem em situação crítica: 66% nunca foram a um museu e 85% nunca participaram de um sarau. Concertos têm ainda menos adesão: 89% nunca foram.

Além disso, 70% das atividades culturais acontecem longe dos bairros onde os entrevistados moram, dificultando o acesso. Apenas 7% declararam ter opções no próprio bairro.

Para a secretária-adjunta de Cultura do município, Jacqueline Vital, a comparação entre Campo Grande e capitais do Sudeste não é justa: “Lá eles têm atores na vitrine, na TV, que conseguem captar recursos privados e levar peças de grande porte. Trazer esse espetáculo para Campo Grande tem um valor financeiro alto, que impacta no bolso de quem vai assistir”, afirmou.

Ela destacou ainda a falta de preparo da indústria cultural para atender ao público idoso:
“O Brasil está envelhecendo, mas o cinema segue com o mesmo barulho, a mesma acomodação, o mesmo tempo de filme. Não está produzindo para esse público. E eles estão ativos, saem, namoram, têm vida noturna. Precisamos pensar nesse novo brasileiro.”

Campo Grande é a pior capital do país em acesso à cultura, aponta pesquisa
Pesquisa foi apresentada nesta quarta-feira para produtores e gestores da cultura em MS. (Foto: Natália Olliver)

Para ela, o desafio é ampliar os recursos e atrair público para o que já é produzido localmente: “Os jovens estão mergulhados nas telas e perderam o interesse por bibliotecas, museus, saraus. É natural da faixa etária, mas nós, fazedores de cultura, temos que criar eventos que englobem.”

Outro ponto ressaltado por Jacqueline é a pouca valorização dos espaços históricos: “É um problema do brasileiro. Lá fora, ele paga em euro para andar horas e visitar um local histórico. Aqui, passa em frente ao museu todo dia e não entra. O cotidiano engole a gente, mas a riqueza está dentro do próprio município.”

No entanto ela destacou que a prefeitura está aberta para entender melhor o levantamento, inclusive solicitou mais detalhes sobre os bairros em que foram feita a pesquisas. A secretária acrescentou que a pasta tem se esforçado para tirar algumas obras paradas do papel e que que a entrega da Morada dos Baís é um exemplo disso. Ela também falou sobre a abertura do Fmic (Fundo Municipal de Investimentos Culturais de Campo Grande).

A assessora executiva da Fundação de Cultura, Giovana Corrêa, disse ter se surpreendido com os resultados da pesquisa. “Eu vejo de grande relevância a pesquisa, porque é importante termos esses dados até mesmo para formular novos projetos, festivais e editais. O Estado trabalha com os 79 municípios, e nossa preocupação é com todos eles. Vamos estudar e ver onde estão essas falhas”, afirmou.

Já o produtor cultural Rodrigo Teixeira não demonstrou surpresa. Para ele, os números refletem diretamente a ausência de políticas culturais consistentes nos últimos anos.

“Os números me impactaram, mas não me surpreenderam. O hábito cultural tem a ver com política cultural, com a demanda que existe para que esse hábito seja formado. E o que vimos nos últimos anos foi um grande desmonte dos aparelhos culturais. Hoje, em Campo Grande, quantos espaços culturais estão fechados há anos? Não é à toa que, na pesquisa, o Carnaval aparece como o principal evento artístico da cidade”, disse.

Rodrigo listou equipamentos culturais que ainda estão de portas fechadas na Capital, alguns deles há anos, outros com previsão de reabertura. “Temos a Morada dos Baís fechada, o Teatro do Paço fechado, o próprio Centro Cultural, que ficou oito anos fechado; o Cine Campo Grande fechado; o Centro Belas Artes também fechado. Então, acho que a pesquisa vem justamente para mostrar essa realidade difícil”, completou.

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