Crédito, AFP via Getty Images
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- Author, Alice Cuddy, repórter internacional sênior da BBC News em Lisboa, e Julia Braun, da BBC Brasil em Londres
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Mas um dos sobreviventes da tragédia é um menino alemão de 3 anos. Ele foi resgatado do vagão onde estava com seu pai e sua mãe, que assim como a criança estão entre os mais de 20 feridos do acidente.
O descarrilamento do famoso bondinho da capital portuguesa deixou ao menos 16 mortos na quarta-feira (3/9). Cidadãos de Portugal, Reino Unido, Coreia do Sul, Suíça, Canadá, Alemanha e Ucrânia estão entre as vítimas, segundo a polícia.
Ainda não está claro o que causou o acidente. A operadora de transporte público da capital, Carris, disse que todos os funiculares seriam inspecionados e que havia iniciado uma investigação independente.
A elite política portuguesa compareceu à Igreja de São Domingos na noite de quinta-feira (4/9) para um culto em homenagem aos mortos.
Do lado de fora da igreja, as pessoas pediram uma investigação completa sobre o ocorrido. “Precisamos que as pessoas saibam que estão seguras aqui”, disse uma mulher enquanto outras concordavam.
Uma moradora que passava pelo local do acidente, onde os destroços do funicular ainda podem ser vistos, disse à BBC que “ainda estava processando” o ocorrido. “É muito, muito triste”, disse ela.
Outros se reuniram e tiraram fotos dos destroços ou ficaram em silêncio, observando. Dois turistas de Singapura disseram que tinham programado pegar o funicular na quarta-feira, mas mudaram de planos na última hora.
“É assustador… Quem sabe, talvez estivéssemos neste”, disse um deles. “Isso muda sua perspectiva de vida. Você simplesmente não espera que algo assim aconteça.”
“Estás bem? Calma, calma”
A identidade de todas as vítimas fatais da tragédia ainda não foi confirmada, mas já se sabe que um menino de 3 anos está entre os sobreviventes.
A criança foi atendida por um agente da Polícia de Segurança Pública local e teve apenas ferimentos leves, segundo a imprensa portuguesa.
À TVI, um canal de televisão local, um funcionário de uma loja próxima à área do acidente afirmou ter visto o menino chorando assim que se aproximou dos destroços para ajudar as vítimas, antes da chegada das autoridades.
“Ele estava com sangue no rosto e chorando”, disse o homem identificado como Moḥammed pela emissora. Ele também compartilhou um vídeo do momento em que um amigo que estava com ele pega o menino no colo para ajudá-lo.
“Estás bem? Calma, calma”, diz ele à criança, nas imagens filmadas instantes após o descarrilamento.
Inicialmente, acreditava-se que o pai do menino havia morrido no acidente. Mas segundo a CNN Portugal, a família de Hamburgo conseguiu localizar o homem internado em um hospital.
Os familiares das vítimas teriam inicialmente tentado identificar seu parente entre os corpos das vítimas no Instituto de Medicina Legal, mas não conseguiram.
Posteriormente, após mostrarem a foto do homem a um policial no centro de Lisboa, foram informados que ele estava internado no Hospital de São José.
Segundo a CNN Portugal, além do homem de 46 anos, a mãe do menino, de 45 anos, também está internada, em estado crítico, mas estável, em outro hospital da capital.
‘As pessoas começaram a pular pelas janelas’
A guia turística Mariana Figueiredo estava entre as pessoas presentes no local do acidente na noite de quarta-feira. Ela disse ter ficado traumatizada com o que testemunhou.
Figueiredo disse ter corrido para o local após ouvir um grande estrondo perto de onde seu TukTuk estava estacionado.
“Em cinco segundos eu estava lá”, disse ela. “As pessoas começaram a pular das janelas dentro do funicular, na base do morro. Então eu vi outro [mais acima] que já estava esmagado.
“Comecei a subir o morro para ajudar as pessoas, mas quando cheguei lá, a única coisa que eu conseguia ouvir era o silêncio.”
Figueiredo disse que, quando ela e outras pessoas começaram a retirar o teto do funicular, viram cadáveres lá dentro.
Ela disse ter testemunhado crianças sendo resgatadas e tentou ajudar pessoas com ossos quebrados e acalmar as que estavam em perigo.
“Muitas pessoas estavam chorando ao meu redor. Elas estavam muito assustadas. Eu estava tentando acalmá-las.”
Crédito, Reuters
Um homem, que estava em outro funicular na base da colina no momento do acidente, disse a repórteres que pensou que fosse morrer. “Não importa quantos anos eu viva, nunca mais pegarei o funicular”, disse ele.
A polícia não divulgou oficialmente o nome de nenhum dos mortos ou feridos, mas afirmou em uma coletiva de imprensa na quinta-feira que acredita que dois canadenses, um alemão e um ucraniano estejam entre os mortos.
A informação foi divulgada após uma atualização anterior, na qual a polícia afirmou acreditar que cinco portugueses, dois sul-coreanos e um suíço haviam sido identificados.
O sindicato português dos transportes informou que André Jorge Gonçalves Marques, que operava o sistema de freio do bonde, está entre os mortos.
A Santa Casa da Misericórdia confirmou que quatro de seus funcionários também morreram no acidente. Os trabalhadores usavam o funicular como meio de transporte diário.
Um funcionário do elevador, Valdemar Bastos, disse à BBC que os trabalhadores da instituição, localizada no topo de uma colina íngreme, costumavam usar o funicular junto com turistas e idosos.
“Sempre me senti seguro”, disse ele. “Nunca pensei que isso pudesse acontecer.”
Na quinta-feira, o responsável pela Carris, operadora de transportes públicos de Lisboa, anunciou que todos os funiculares da cidade ficariam fechados até à realização de inspeções técnicas.
Pedro Gonçalo de Brito Aleixo Bogas afirmou a jornalistas que a Linha da Glória reabrirá no futuro, mas com uma nova carruagem. Ele disse ainda que a empresa ampliou seus gastos com a manutenção dos funiculares — que funcionavam corretamente desde 2007 —, acrescentando que o custo da sua manutenção mais do que duplicou nos últimos 10 anos.
As conclusões da investigação sobre o acidente serão divulgadas em breve, afirmou Brito Bogas, sem especificar uma data exata.
Imagens compartilhadas nas redes sociais mostram os momentos logo após o acidente, com o funicular amarelo amassado e tombado na rua de paralelepípedos e pessoas correndo do local cheio de fumaça.
Vários passageiros presos nos destroços precisaram ser resgatados por socorristas, disseram as autoridades locais.
As autoridades de Lisboa inicialmente estimaram o número de mortos em 17, mas posteriormente revisaram o total para 16 após a descoberta de que uma pessoa que morreu no hospital durante a noite havia sido contabilizada duas vezes.
Um funicular é um tipo de sistema ferroviário que permite subir e descer encostas íngremes e, em Lisboa, é um meio essencial para navegar pelas ladeiras de paralelepípedos da cidade.
Os funiculares da cidade — Glória, Lavra, Bica e Graça — são uma atração turística popular, com seus veículos amarelos brilhantes, semelhantes a bondes, serpenteando pelas ruas, muitas vezes estreitas e íngremes.
O Elevador da Glória foi inaugurado em 1885 e eletrificado três décadas depois.
Ele percorre cerca de 275m dos Restauradores, uma praça central da cidade, até as pitorescas ruas do Bairro Alto. A viagem leva apenas três minutos.
Os dois vagões da linha Glória estão presos a extremidades opostas de um cabo de reboque, puxado por motores elétricos.
À medida que um vagão desce, seu peso levanta o outro, permitindo que subam e desçam simultaneamente, reduzindo a energia necessária para transportá-los.
O segundo vagão, intacto, pode ser visto a poucos metros dos destroços na base da colina.