O almirante Almir Garnier Santos, que comandou a Marinha durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), negou nesta terça (10) que tenha sido favorável à suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Ele é o terceiro réu ouvido pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) na fase depoimentos dos acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de fazerem parte do “núcleo 1” – ou “crucial” – do processo.
Garnier é acusado pela PGR de ter colocado a Marinha à disposição de Bolsonaro no suposto plano para mantê-lo no poder e evitar a posse do então presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele, inclusive, se recusou a participar da cerimônia de passagem do comando para o sucessor, Márcio Sampaio Olsen, escolhido pelo petista.
De acordo com o militar, não houve qualquer deliberação sobre isso na reunião do dia 7 de dezembro de 2022 que, segundo as investigações, ele teria informado a Bolsonaro a disposição de colocar as tropas da Marinha nas ruas. O militar afirma nunca ter citado essa possibilidade em qualquer reunião com o ex-presidente.
“Não houve deliberações nem o presidente abriu a palavra para nós [o general Freire Gomes, comandante do Exército à época, também estava na reunião]. Ele fez as considerações dele que me pareceram mais preocupações e análises de possibilidades do que propriamente ideia de conduzir em uma certa direção. O que percebi que me era tangível era a preocupação com a segurança pública, ao qual a GLO [operação de Garantia da Lei e da Ordem] é adequada dentro de certos parâmetros”, disse Garnier durante o depoimento.
Além de Garnier, também já foram ouvidos pela Primeira Turma do STF nesta fase de depoimentos o tenente-coronel Mauro Cid, que delatou o plano às autoridades, e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que comandou a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) em parte do governo Bolsonaro.
Garnier seguiu no depoimento afirmando que a reunião de 7 de dezembro foi convocada por Bolsonaro para deliberar sobre o cenário em que o país estava mergulhado na época, com uma grande insatisfação popular pelo resultado das eleições, com acampamentos em frente aos quartéis e o início de um movimento de protesto de caminhoneiros. No entanto, disse, o encontro tratou apenas de preocupação de Bolsonaro com a estabilidade do país.
“Entre os assuntos, esse ocupou grande parte do tempo. Houve a apresentação de tópicos de considerações, não foi decidido isso naquele dia, a decretação de uma GLO ou medidas adicionais visando a segurança pública. Não vi minuta, mas uma apresentação na tela de um computador. Não recebi esse tipo de documento [minuta impressa de um suposto decreto de sítio]”, afirmou.
O militar negou também que a reunião realizada uma semana depois com os outros dois comandantes das Forças Armadas e o ministro Paulo Sérgio Nogueira, da Defesa, tenha apresentado alguma suposta minuta de estado de sítio. O assunto do encontro foi, novamente, a presença de manifestantes em frente aos quarteis, principalmente o Quartel-General do Exército em Brasília.
“Não houve a apresentação de nenhum documento na reunião”, disse ressaltando que não houve qualquer deliberação no encontro, que essa foi uma “reunião estranha” que “se encerrou antes de começar”, que ele chegou um pouco atrasado e que parece ter havido uma discussão, pois o ministro “parecia chateado”.
O almirante, agora da reserva, negou ainda que tenha ouvido falar sobre fraudes ou necessidade de uma nova eleição naquele encontro, e que havia o trabalho de uma equipe das Forças Armadas junto à Justiça Eleitoral para averiguar a transparência do processo. Ele seguiu pontuando que Bolsonaro discutia medidas legais com o PL sobre a condução da Justiça Eleitoral, mas sem sinalizar alguma acusação sobre isso.
Ainda durante o depoimento, Garnier criticou os demais depoimentos já prestados ao STF e durante as investigações sobre o suposto plano de golpe, afirmando que foram ditas ilações e “conversa de bar”, e que ele se ateve a seu “papel institucional”. E negou que tenha pressionado ou inflado algum movimento contra o general Freire Gomes nas redes sociais por não aderir ao movimento.
Ainda em relação a Freire Gomes, Garnier negou que tenha participado de qualquer reunião que ele tenha dado voz de prisão a Bolsonaro por supostamente apresentar uma minuta de decreto de estado de sítio ou de defesa, e considerou a afirmação como “surreal” pelo que diz ter tomado conhecimento pela imprensa.
“Eu achei surreal, não faz parte das normas das Forças Armadas, da hierarquia e da disciplina atitudes dessa natureza com esse contexto”, pontuou.
Almir Garnier negou ser crítico às urnas eletrônicas, disse que escalou dois oficiais superiores para fazerem parte da comissão de acompanhamento do processo eleitoral, teve conhecimento do relatório produzido de que não foram encontradas irregularidades, mas não soube explicar o motivo da réplica do Ministério da Defesa sobre dúvidas em relação a votações futuras.
O militar também negou qualquer relação com os atos de 8 de janeiro de 2023, tendo se desligado das atividades na Marinha no dia 31 de dezembro de 2022. Ele afirmou ter ficado chocado com o que aconteceu.
Assim como os demais réus do alegado “núcleo crucial” do plano, Garnier é acusado dos crimes de organização criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Mais informações em instantes.