Crédito, Jorge Silva/Reuters
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- Author, Marina Rossi
- Role, Da BBC News Brasil em São Paulo
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Bolsonaro também está proibido de receber visitas, “salvo de seus advogados regularmente e com procuração nos autos, além de outras pessoas previamente autorizadas” pelo STF.
Os visitantes autorizados não poderão usar celular, fazer fotos ou gravar vídeos, assim como o ex-presidente, que também está proibido de usar o celular “diretamente ou por intermédio de terceiros”.
O mandado de busca e apreensão de aparelhos celulares do ex-presidente foi cumprido no fim da tarde em Brasília, segundo informou a Polícia Federal.
A defesa de Bolsonaro afirmou ter sido “surpreendida” com o decreto da prisão domiciliar, já que o ex-presidente “não descumpriu qualquer medida”.
Por meio de nota, os advogados afirmaram que Bolsonaro não estava proibido de dar entrevistas ou fazer discursos públicos.
“A frase ‘boa tarde, Copacabana. Boa tarde meu Brasil. Um abraço a todos. É pela nossa liberdade. Estamos juntos’, não pode ser compreendida como descumprimento de medida cautelar, nem como ato criminoso.”
Na decisão, Moraes afirma que o ex-presidente descumpriu as medidas cautelares impostas no dia 17/7, quando ele determinou o uso de tornozeleira eletrônica ao ex-presidente, além da proibição do uso de redes sociais diretamente ou por intermédio de terceiros.
Isso porque, segundo o despacho desta segunda, Bolsonaro “produziu material para publicação nas redes sociais de seus três filhos e de todos os seus seguidores e apoiadores políticos, com claro conteúdo de incentivo e instigação a ataques ao Supremo Tribunal Federal e apoio, ostensivo, à intervenção estrangeira no Poder Judiciário brasileiro.”
O ministro se referiu às manifestações ocorridas neste domingo (3/8) em diversas cidades do país. Neste dia, Bolsonaro apareceu por meio de uma ligação de vídeo no celular do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), em São Paulo, e depois em um vídeo na rede social de um dos filhos, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
“A participação dissimulada de Jair Messias Bolsonaro, preparando material pré-fabricado para divulgação nas manifestações e redes sociais, demonstrou claramente que manteve a conduta ilícita de tentar coagir o Supremo Tribunal Federal e obstruir a Justiça, em flagrante desrespeito as medidas cautelares anteriormente impostas”, escreve o ministro.
Para Moraes, “as condutas de Jair Messias Bolsonaro, desrespeitando, deliberadamente, às decisões proferidas por esta Suprema Corte, demonstram a necessidade e adequação de medidas mais gravosas de modo a evitar a contínua reiteração delitiva do réu, mesmo com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão.”
Crédito, Leandro Prazeres/BBC
A prisão domiciliar foi decretada nos autos do inquérito que apura a conduta do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) pelos crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação da chamada trama golpista e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
O inquérito foi aberto em maio, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que apontou que Eduardo Bolsonaro, que atualmente vive nos Estados Unidos, tem feito declarações públicas e postagens em redes sociais afirmando que atua para que o governo norte-americano imponha sanções a ministros do STF e a integrantes da PGR e da Polícia Federal.
Segundo a representação criminal, as manifestações têm tom intimidatório e vêm se intensificando à medida que avança a tramitação da ação penal em que o ex-presidente é acusado de liderar uma organização criminosa para tentar dar um golpe após as eleições de 2022.
Nessa esteira, o presidente americano, Donald Trump, anunciou tarifas retaliatórias de 50% sobre produtos brasileiros, que começarão a valer a partir desta quarta-feira (6/8).
E na semana passada, o governo americano aplicou contra Moraes a Lei Global Magnitsky — uma das mais severas disponíveis para Washington punir estrangeiros que considera autores de graves violações de direitos humanos e práticas de corrupção.
Crédito, Pilar Olivares/Reuters
‘Flagrante óbvio’
As manifestações ocorridas no domingo em diversas cidades do país contaram com a presença “virtual” de Bolsonaro, por meio do celular do deputado Nikolas Ferreira, em São Paulo.
Nas redes sociais, Ferreira chamou a decisão de “ditadura confusa” e disse que Moraes deveria ir para a “cadeia”.
No Rio de Janeiro, o senador Flávio Bolsonaro, que era também um dos organizadores do ato, ligou para o ex-presidente, colocando a chamada brevemente no viva-voz.
Em seguida, Flávio publicou um vídeo mostrando o pai durante a ligação, em casa, mandando uma mensagem a seus apoiadores.
A publicação foi apagada posteriormente, o que, segundo Moraes, foi com “um claro intuito de omitir o descumprimento das medidas cautelares praticado por seu pai”.
“O flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, na rede social Instagram, com a finalidade de omitir a transgressão legal”, escreveu Moraes.
Efetivamente, não há dúvidas de que houve descumprimento da medida cautelar imposta, uma vez que, as redes sociais do investigado Eduardo Nantes Bolsonaro foram utilizadas a favor de Jair Messias Bolsonaro”.
Reações
“Não é coincidência que aqueles que mais enfrentam o sistema sejam os mais perseguidos por ele. O poder que deveria proteger o cidadão de bem, hoje serve a interesses políticos. A prisão domiciliar imposta a Bolsonaro não é justiça, é perseguição!”, diz a nota do PL, publicada em redes sociais.
O líder do partido na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), escreveu em sua rede social que a prisão de Jair Bolsonaro demonstra que a democracia no Brasil teria acabado.
“Não há mais instituições, há tiranos com toga”, disse Cavalcante, defendendo que o ex-presidente não teria cometido crime e nem teria tido direito à defesa.
Eduardo Bolsonaro afirmou que a prisão ocorreu “sem crime, sem evidências, sem julgamento”.
Ele publicou nas suas redes sociais uma nota em português e outra em inglês, dizendo que “o Brasil não é mais uma democracia. O mundo precisa notar isso”.
Assim como o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), Eduardo Bolsonaro afirmou que a decisão de Moraes ocorreu no mesmo dia em que a organização Civilization Works publicou dossiê acusando Moraes de criar uma “estrutura paralela de inteligência” para investigar perfis nas redes sociais dos envolvidos no ato golpista de 8 de janeiro para justificar as prisões.
O senador Flávio Bolsonaro, disse em entrevista à CNN Brasil que a prisão do pai demonstra que o Brasil estaria agora “oficialmente numa ditadura”.
“Uma única pessoa sozinha decreta a prisão de um ex-presidente da República, uma pessoa honesta, uma pessoa correta”, disse Flávio, afirmando que o processo contra o pai seria um “jogo de cartas marcadas”.
“Era tudo o que o Alexandre Moraes queria, se vingar do presidente Bolsonaro.”
O senador acusou Moraes de previamente “desequilibrar o processo eleitoral” quando foi presidente do TSE, durante as eleições de 2022 — “pesando mais a favor do nosso concorrente”, nas palavras de Flávio.
A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL-RJ) escreveu uma mensagem curta, sem mencionar nomes. “E os céus anunciarão a sua justiça; pois Deus mesmo é o juiz”, escreveu ela no Instagram.
Crédito, Getty Images
O deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) afirmou que a decisão de Moraes é “uma afirmação de um regime de exceção, uma ditadura escancarada.” No X, chamou Moraes de “um descontrolado dependendo da solidariedade dos outros ministros do Supremo e do presidente do Senado”.
Ramagem é um dos indiciados no inquérito da “Abin paralela”, que apura a existência de uma organização criminosa voltada ao monitoramento ilegal de autoridades públicas e à produção de notícias falsas, utilizando-se de sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), da qual Ramagem era diretor-geral no governo de Bolsonaro.
Já o líder do PT na Câmara dos Deputados, o parlamentar Lindbergh Farias (RJ) afirmou que a prisão determinada pelo STF foi “proporcional à gravidade dos atos”.
“A medida não se deu apenas por descumprir as cautelares já impostas, mas por reincidir de forma deliberada, debochar da autoridade judicial e seguir atuando contra o Estado Democrático de Direito”, defendeu o petista na rede social X.
“Ele [Jair Bolsonaro] apareceu em chamada de vídeo durante ato público, com divulgação em redes sociais administradas por seus filhos, violando a proibição de uso direto ou indireto de redes. Além disso, segue promovendo sanções estrangeiras contra o Brasil e atentando contra a soberania nacional em articulação com atores políticos internacionais”, enumerou Farias.
Membro do governo Lula, Marcelo Freixo (PT-RJ) defendeu em suas redes sociais que Bolsonaro foi penalizado com a prisão domiciliar porque “descumpriu mais uma vez uma decisão judicial”.
“Bolsonaro tentou transformar tornozeleira e proibição de redes em espetáculo público. Houve descumprimento reiterado de decisão judicial. Desacato de decisão judicial não é discurso político, é crime. Ele pediu pra ser preso”, argumentou Freixo, presidente da Embratur.
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), classificou a prisão de Jair Bolsonaro como um “capítulo sombrio na história de perseguição política do STF”.
Segundo escreveu Zema em sua conta no X (ex-Twitter), Bolsonaro teria sido punido apenas por ter tido “sua voz ouvida nas redes”. O governador prestou solidariedade ao ex-presidente e sua família.
Com reportagem de Mariana Alvim.