Por João Pedro Carvalho
Agência de Notícias do CEUB
Diferentes gostos musicais, preferências culinárias, manias no cotidiano… Mas uma nova divisão tem se tornado cada vez mais relevante para o fim de relacionamentos: a ideológica.
Discussões sobre política, religião e valores sociais têm deixado de ser apenas temas espinhosos e, muitas vezes, se tornam o estopim do término.
O psicólogo André Lubec avalia que diferenças podem até ser interessantes se forem encaradas como forma de crescer junto.
“Mas, quando tocam em valores estruturantes da vida da pessoa, como ética, fé ou visão de mundo, se tornam ameaças à identidade”.
Para o profissional, isso pode desgastar, geras frustração e, inevitavelmente, a admiração pode ir embora. “Sem admiração, é comum o desejo também desaparecer”, avalia o psicólogo.
Lubec acrescenta que tentar convencer o outro a mudar seu ponto de vista pode ser não apenas inútil, mas destrutivo.

“É uma forma de arrogância. Quando alguém tenta converter o parceiro, está dizendo, ainda que de forma sutil: ‘meu valor é mais importante que o seu’”.
Isso pode gerar um desequilíbrio profundo. Um relacionamento baseado em dominação de ideias, e não em parceria, está fadado ao fracasso, defende o profissional.
Segundo ele, a atração se sustenta também no respeito. Quando isso se quebra, a intimidade perde espaço para o conflito.
Política no caminho
A estudante Isabela Silvério, de 22 anos, viveu isso na pele. Quando começou a namorar, aos 16 anos de idade, não imaginava que diferenças políticas teriam tanto peso no futuro da relação.
“Eu curso ciências sociais e sou politizada. Ele vinha de uma família militar e muito ‘bolsonarista’. No começo, a gente evitava falar sobre isso, mas com o tempo, os comentários dele sobre minha faculdade e minha forma de pensar foram me desgastando”, lamenta.
Ela teria ouvido do namorado expressões preconceituosas. “Chegou um momento em que a gente nem discutia mais porque ele não aguentava ouvir meus argumentos”, comenta Isabela.
“Me chamou de fascista”
Um outro relato de uma pessoa que preferiu para não se identificar ocorreu depois que a namorada, que tem família de viés de esquerda política, ofendeu o namorado.
“Ela era muito fã do Lula, do tipo que não aceitava críticas. Um dia, o namorado da minha prima respondeu um post dela no Instagram com um comentário contrário, e ela surtou. Xingou a família inteira, inclusive a minha, que nem tinha nada a ver”.
A namorada teria mandado áudios aos gritos.
“Me chamou de fascista. E depois ainda me cobrou por não defendê-la. Ali eu percebi que não dava mais. Fiquei com um pé atrás e terminei.”
Soluções
A solução, segundo o terapeuta, não está em suprimir a identidade de cada um, mas em escolher com sabedoria os momentos de expor divergências.
“Evitar discutir temas críticos no dia a dia é uma forma de preservar o relacionamento. Política, religião, valores éticos profundos, se forem tratados com frequência, viram pontos de atrito constantes. O ideal é que o casal crie espaços para a convivência prazerosa, para a troca, para as descobertas em comum”, afirmou.
Ela avalia que, se a diferença se torna mais presente do que a conexão, o vínculo se rompe.
Lubec ainda alerta que rastrear as divergências do outro como quem procura um erro pode ser um sinal de autossabotagem.
“Em vez de construir experiências boas, a pessoa foca no que separa. E isso gera afastamento, quebra a sensação de apoio e companheirismo, essenciais para manter o desejo vivo.”
Critério para namorar
Isabela conta que, mesmo depois do término, a questão política continua sendo um critério importante na hora de conhecer alguém.
“Hoje, eu já vejo se o cara tem discurso machista, elitista, ou se repete frases sem saber o que está falando. Eu não tenho mais paciência”, diz a estudante. Segundo o psicólogo, a conclusão parece dura, mas é real: nem sempre o amor basta quando há um abismo entre os valores.
Supervisão de Luiz Claudio Ferreira