Fux confirma divergência e vota para absolver Bolsonaro


O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta (10) para absolver o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de todos os crimes imputados a ele pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no processo sobre a suposta tentativa de golpe de Estado. O placar está em 2 a 1 para condenar Bolsonaro.

Até o momento, Fux defendeu a absolvição do ex-presidente e do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier. Ele votou pela condenação do tenente-coronel Mauro Cid apenas pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O ministro ainda precisa se manifestar sobre outros cinco réus do “núcleo 1”. A sessão já dura mais de 10 horas.

O voto de Fux era o mais aguardado no julgamento contra Bolsonaro e aliados por conta das divergências que havia apontado anteriormente. Havia, ainda, a possibilidade de que poderia pedir vista – ou seja, mais tempo para analisar o caso – e atrasar o resultado do julgamento.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, acusou o ex-presidente e outros sete réus do “núcleo 1” pelos crimes de: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; tentativa de golpe de Estado; participação em organização criminosa armada; dano qualificado por violência e grave ameaça; e deterioração de patrimônio tombado.

Sobre a acusação de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado, ele disse que o ex-mandatário não pode ser responsabilizado. “Condutas praticadas pelo réu durante seu mandato como presidente da República não podem configurar o crime previsto no 359-M, do Código de Processo Penal, pois pressupõe a prática de conduta de tentar remover o mandatário do cargo, e era ele o mandatário do cargo”, destacou o ministro.

Fux afirmou que “não é possível aceitar” a tentativa de vincular Bolsonaro aos atos de 8 de janeiro de 2023 com base apenas em discursos e entrevistas. O ministro apontou que a PGR preferiu “adotar uma narrativa desprendida da cronologia dos fatos alegados” em vez de individualizar as condutas dos réus.

Para fundamentar o voto no caso de Bolsonaro, Fux afirmou que era preciso analisar três acusações: o uso da “Abin paralela”, a atuação contra o sistema eleitoral e a suposta tentativa de golpe de Estado. Ele considerou que a PGR não comprovou a efetiva participação do ex-presidente na “Abin paralela” e apontou que os discursos e entrevistas de Bolsonaro contra as urnas não configuram uma tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito, porque manifestações críticas aos Poderes não constituem crime contra o Estado de Direito.

O ministro sustentou que o PL, partido de Bolsonaro, tinha o direito de questionar a segurança das urnas eletrônicas em 2022. Na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes multou o partido em R$ 22 milhões. “Representar ao Tribunal Superior Eleitoral não é crime. É a garantia da cláusula pétrea de acesso à Justiça. De qualquer sorte, as provas apresentadas pela PGR apenas denotam que o réu Jair Bolsonaro tinha o intuito de buscar a verdade dos fatos sobre o funcionamento do sistema eletrônico de votação”, disse o ministro.

Sobre as blitze realizadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) durante o segundo turno das eleições 2022, Fux afirmou que Bolsonaro não pode ser punido por atos de terceiros. Ele destacou que seria necessário provar que o ex-presidente “foi cotitular da resolução comum pelo fato e da realização comunitária do tipo”.

“Todos esses elementos conduzem à inescapável conclusão de que não há provas suficientes para imputar ao réu Jair Messias Bolsonaro os crimes de: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado por violência e grave ameaça; e deterioração de patrimônio tombado”, afirmou Fux.

VEJA TAMBÉM:

Fux também defendeu a absolvição do ex-presidente em relação ao crime de organização criminosa armada. “A existência de um suposto plano criminoso — suposto — não basta para a caracterização da organização criminosa. É ônus do Ministério Público demonstrar que os membros da alegada organização, estruturada, permanente e estável, devem colaborar com a unidade de desígnios para a prática de uma série indeterminada de delitos. Nada disso restou demonstrado nos autos”, destacou.

“Por isso, julgo improcedente a pretensão acusatória em relação ao réu Jair Messias Bolsonaro com base no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal”, concluiu o ministro.

Fux aponta “contradição” em narrativa sobre “minuta do golpe”

O ministro classificou a chamada “minuta do golpe”, que previa a decretação de estado de sítio e da Garantia da Lei e da Ordem (GLO), como uma “carta de lamentação”. Uma foto do documento foi encontrada no celular do tenente-coronel Mauro Cid. “O que se sabe dessa minuta se limita aos seus considerandos e ao trecho que dispõe ‘declaro Estado de Sítio e, como ato contínuo, decreto operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Aconteceu alguma coisa? Nada.”

Fux afirmou que não há um único elemento de prova que indique que o texto foi apresentado a Bolsonaro ou aos comandantes das Forças Armadas. Em 2024, a Polícia Federal encontrou o mesmo documento na sala de Bolsonaro na sede do PL. O magistrado considerou que o documento fazia parte dos documentos preparados pela defesa do ex-mandatário.

“A execução das medidas previstas nesta minuta dependeria de atos preparatórios envolvendo diversas outras autoridades, além do presidente da República. O Estado de Sítio depende de pré-autorização do Congresso […] É inegável que a minuta precisaria passar por inúmeras providências para que se gerasse uma tentativa com violência e grave ameaça”, ressaltou. 

Fux também criticou as “ilações” da PGR sobre as reuniões de Bolsonaro com os ex-comandantes Baptista Júnior (Aeronáutica) e Freire Gomes (Exército); com o general Estevam Theophilo (ex-comandante do Comando de Operações Terrestres – Coter); e com o ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, Filipe Martins.

O ministro disse que o documento não passou “de mera cogitação” da possibilidade de adoção das medidas pelo ex-presidente, destacando que a simples discussão do tema não configura atos executórios.

Não há provas de que Bolsonaro sabia de plano para matar Lula e Moraes, diz Fux

O ministro afirmou que não há evidências na acusação de que Bolsonaro sabia do plano para matar Moraes, o presidente Lula (PT) e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), conhecido como “Punhal Verde e Amarelo”. “Não há nenhum elemento que identifique ciência do ex-presidente em relação à minuta do plano Punhal Verde e Amarelo. A gente aqui conheceu [o plano], mas não há prova aqui que o réu conheceu”, disse.

“O mais importante para a análise presente é perceber que não há absolutamente nenhuma prova que denote a ciência ou a contribuição do réu Jair Bolsonaro para as ações documentadas no grupo ‘Copa 2022’”, acrescentou Fux.

Fux reforça que Bolsonaro não pode ser associado aos atos de 8/1

O ministro considerou que não há provas de que Bolsonaro exercia um papel de liderança ou controle sobre os manifestantes. Ele voltou a afirmar que o ex-presidente já não era mais chefe de Estado quando a invasão ocorreu.

Para Fux, a PGR apresentou “alegações infundadas” e “não logrou apontar absolutamente nenhuma prova de que Jair Bolsonaro tivesse algum vínculo com sujeitos que invadiram prédios públicos na Praça dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Não apresentou provas de vínculo do ex-presidente com os participantes das manifestações de novembro e dezembro, sem contar com as de 8 de janeiro”, disse.

Julgamento de Bolsonaro

A Procuradoria-Geral da República (PGR) imputou cinco crimes aos réus do “núcleo 1”: tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado por violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

Com a divergência de Fux, ainda faltam votar os ministros Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, que preside o colegiado, nas sessões marcadas para quinta (11). Já a de sexta (12) se espera ser utilizada para estabelecer a dosimetria das penas em caso de condenação a depender dos votos dos dois magistrados.

Nos votos já dados na terça (9), Moraes decidiu pela condenação de Bolsonaro e os demais réus, classificando o ex-presidente como líder de uma “organização criminosa”. Dino o acompanhou no entendimento, mas defendeu penas mais severas tanto para o ex-presidente quanto para o ex-ministro Walter Braga Netto. Durante a sessão, Dino rechaçou pressões externas.

“Argumentos pessoais, agressões, coações, ameaças de governos estrangeiros não são assuntos que constituem matéria decisória. Quem veste essa capa [toga] tem proteção psicológica suficiente para se manter distante disso”, afirmou.

Fux divergiu das alegações dos colegas Alexandre de Moraes e Flávio Dino, afirmando que a Corte e a Primeira Turma não têm competência para julgar esta ação penal, entre outros motivos.



Source link

Leave a Reply

Translate »
Share via
Copy link