Crédito, X/@KristiNoem
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- Author, Bernd Debusmann Jr*
- Role, BBC News
Em declaração a jornalistas num trecho da fronteira no estado do Novo México, Noem afirmou na terça-feira (19/8) que a pintura preta foi “um pedido expresso do presidente”.
“[Trump] entende que, com as altas temperaturas que fazem aqui, quando se pinta algo de preto, esquenta ainda mais. Isso tornará mais difícil para as pessoas escalarem”, acrescentou.
Em sua conta no X, Noem escreveu: “Este muro faz parte da mudança. Alto demais para escalá-lo. Estreito demais para atravessá-lo. E agora, tão quente ao toque que criminosos estrangeiros ilegais nem sequer tentarão”.
Agentes da Patrulha de Fronteira afirmam que a pintura preta também ajudará a evitar que o muro enferruje.
Além das detenções e deportações que marcam a política migratória do governo, um projeto de lei proposto por Trump e aprovado no início deste verão no país destinou US$ 46 bilhões (R$ 251 bilhões) para a expansão do muro ao longo da fronteira.
Segundo Noem, a cada dia são construídos cerca de 0,8 km de muro ao longo dos quase 3.218 km de fronteira.
“É tanto um escudo quanto um símbolo: um monumento ao compromisso inabalável do presidente Trump com este país e com a segurança do povo americano”, escreveu Noem no X.
‘Custo exorbitante’
Não é a primeira vez que o governo dos EUA considera pintar de preto o muro na fronteira.
Durante o primeiro governo Trump, em 2020, a Agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (CBP, na sigla em inglês) informou que estava testando a pintura em algumas seções da barreira – em San Luis, no Arizona, e em Artesia, no Novo México –, a fim de avaliar os potenciais benefícios da ideia tanto para a manutenção da infraestrutura quanto para o combate à imigração irregular.
Na época, o jornal Washington Post estimou, com base em contratos governamentais aos quais teve acesso, que a mudança de cor do muro poderia custar pelo menos US$ 500 milhões (R$ 2,7 bilhões), dependendo do tipo de tinta e do número de camadas aplicadas.
Um especialista em construção afirmou ao jornal que o metal original do muro já absorvia uma quantidade considerável do calor do deserto e que não havia “razão técnica” para recobri-lo de preto. Ele acrescentou ainda que a tinta preta pode desbotar com o tempo, o que afetaria sua emissividade.
Crédito, Kevin Carter/Getty Images
As críticas desta vez também não demoraram a aparecer.
“A loucura é que eles têm dinheiro para isso, apesar de ser algo que custa milhões de dólares”, escreveu nesta quarta-feira no X Aaron Reichlin-Melnick, do American Immigration Council, uma organização sem fins lucrativos com sede em Washington que defende os direitos dos migrantes.
“O Congresso decidiu cortar recursos destinados a benefícios para os americanos e, em vez disso, entregar bilhões à CBS, que agora usará para pintar o muro de preto”, acrescentou, destacando ainda o “exorbitante gasto de manutenção” que a medida implica, “apesar de ser completamente inútil”.
Os comentários seguem a mesma linha do que o American Immigration Council já havia declarado quando o Congresso aprovou a lei que destinará US$ 46 bilhões para o muro.
“É mais do triplo do que o governo Trump gastou em seu primeiro mandato, apesar de o muro ter sido um fracasso em melhorar ou contribuir de maneira significativa para a estratégia de gestão da fronteira”, afirmou a entidade na ocasião, em comunicado.
O projeto de lei — batizado pelo próprio presidente como o “grande e belo projeto de lei” (One Big Beautiful Bill) — também prevê maior financiamento para o Serviço de Imigração e Alfândega (ICE, na sigla em inglês) em geral.
“Ao aprovar este projeto de lei, o Congresso está retirando cuidados médicos vitais de milhões de americanos para financiar uma agenda de deportação cada vez mais agressiva, perigosa e obsessiva”, denunciou Sarah Mehta, diretora-adjunta para assuntos governamentais da União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU).
“Com mais de US$ 170 bilhões, o ICE se tornará a maior agência de aplicação da lei nos EUA, com um orçamento maior que o da maioria dos exércitos do mundo”, acrescentou.
Medidas de Trump contra a imigração
O número de travessias irregulares na fronteira caiu drasticamente nos últimos meses, e o governo Trump afirma que as detenções em massa estão funcionando como fator de dissuasão da imigração irregular.
A secretária Noem acrescentou que o governo planeja instalar mais “infraestruturas aquáticas” ao longo do rio Grande (rio Bravo, no México), que constitui mais da metade da fronteira entre os dois países.
Embora Noem não tenha dado mais detalhes sobre esses projetos, as autoridades do Texas já instalaram grandes boias laranjas com pontas e cercas fortificadas nas margens, vigiadas pela polícia estadual, pela polícia local e pela Guarda Nacional do Texas em alguns trechos do rio.
Desde o retorno de Trump à presidência, o número de migrantes que cruzam irregularmente a fronteira chegou a mínimos históricos de aproximadamente 4,6 mil em julho e 6 mil em junho — uma redução de 92% em relação ao ano anterior.
Durante o governo Biden, as detenções chegaram a atingir uma média de 6 mil por dia em alguns períodos.
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No início de agosto, Noem afirmou que um total de 1,6 milhão de imigrantes indocumentados deixaram os EUA durante os primeiros 200 dias de governo Trump, sem especificar quantos foram deportados e quantos foram embora por conta própria.
A porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou também no início de agosto que 300 mil imigrantes indocumentados foram detidos no país desde janeiro.
O governo continua defendendo que sua prioridade são as pessoas com antecedentes criminais, mas defensores dos imigrantes têm denunciado que muitas pessoas sem acusações criminais ou com infrações leves acabaram presas nas operações.
A Casa Branca sustenta que o reforço da segurança na fronteira e as deportações em massa tiveram efeito dissuasório e seriam a principal razão para a queda nos números da fronteira entre Estados Unidos e México.
*Com Santiago Vanegas, da BBC News Mundo