Crédito, Gustavo Moreno/STF
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- Author, Daniel Gallas
- Role, Da BBC News em Londres
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Existe a expectativa de que o julgamento chegue ao fim até sexta-feira — com sessões sendo realizadas todos os dias esta semana.
O relator da ação, o ministro Alexandre de Moraes, é o primeiro a expor seu voto. Ele deu início à sessão na manhã desta terça-feira. Antes de iniciar a leitura de seu voto, Moraes refutou as questões preliminares levantadas pelas defesas dos réus.
Na semana passada, os advogados defesa haviam argumentado que o STF não era a Corte adequada para julgar os casos, que houve “document dump” (divulgação excessiva de documentos prejudicando a defesa) por parte da acusação e que a delação premiada do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, não seria válida.
Moraes defendeu a validade da delação de Mauro Cid, considerada uma das principais peças que sustentam a acusação contra Bolsonaro e os outros sete réus.
Moraes rechaçou a tese levantada pelas defesas de que Mauro Cid teria apresentado oito versões diferentes em depoimentos prestados às autoridades, o que indicaria uma contradição em sua delação.
“As defesas insistem e confundem os oito primeiros depoimentos dados sucessivamente […] com oito delações contraditórias. Isso foi reiteradamente dito aqui como se fosse verdade. Isso beira a litigância de má-fé”, disse o ministro.
“Não há nem oito, nem nove e nem catorze delações”, afirmou Moraes.
O ministro também tratou dos questionamentos feitos pelas defesas em razão do vazamento de áudios, pela revista Veja, em que Mauro Cid fala da delação. Nas mensagens, o tenente-coronel diz estar sendo pressionado pela PF para delatar integrantes da trama golpista.
Segundo Moraes, os áudios vazados não afetam absolutamente em nada as informações fornecidas nem trouxeram qualquer prejuízo às defesas, pois os defensores puderam impugnar ponto por ponto o que foi dito nas delações.
Moraes rejeitou a alegação de que ele, na figura de juiz, não poderia ter feito perguntas durante as audiências. A alegação foi feita na semana passada pelo advogado Matheus Milanez, que defende o general Augusto Heleno.
“O juiz não só pode, como deve fazer perguntas nos interrogatórios”, afirmou Moraes.
“A ideia de que o juiz deve ser uma samambaia jurídica durante o processo não tem nenhuma ligação com o sistema acusatório”, disse o ministro.
Após falar sobre questões preliminares, Alexandre Moraes está falando agora sobre o mérito da ação.
O que está acontecendo esta semana?
Se for condenado em todas as acusações, as penas máximas somadas podem superar 40 anos de prisão.
Nesta semana, os cinco ministros da Primeira Turma vão se manifestar se as provas reunidas pela acusação são suficientes para condenar Bolsonaro e os demais réus. São necessários pelo menos três votos para condenação.
O primeiro a votar é Alexandre de Moraes. Cada ministro tem direito a expor seus argumentos, por isso não há previsão sobre quanto tempo deve durar cada voto. Após Moraes, será a vez do ministro Flavio Dino.
Crédito, Gustavo Moreno/STF
Em seguida, votam Luiz Fux e Cármen Lúcia, nesta ordem. O último a votar é o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin. Acredita-se que a leitura dos votos pode durar dias — mas não existe estimativa precisa sobre o tempo.
Caso haja condenação de réus, os ministros precisam ainda deliberar sobre as penas de cada um. O relator Alexandre de Moraes fica encarregado de fazer uma proposta de fixação das penas, que é então votada pelos demais ministros.
As sessões desta semana final do julgamento serão realizadas nos dias:
- 9/9 (terça), com começos às 9h e às 14h
- 10/9 (quarta), às 9h
- 11/9 (quinta). às 9h e às 14h
- 12/9 (sexta), às 9h e às 14h
O que aconteceu na primeira semana
“O Brasil chega em 2025 com uma democracia forte, as instituições independentes, economia em crescimento e a sociedade civil atuante”, disse Moraes, antes de iniciar a leitura do processo.
“O Estado Democrático de Direito não significa tranquilidade ou ausência de conflitos”, acrescentou o ministro, afirmando que o julgamento de Bolsonaro e outros sete réus é “mais um desdobramento do exercício da Constituição.”
Na sequência, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, leu seu parecer, exaltando os instrumentos previstos pela Constituição para defender a democracia.
Em seguida, se manifestaram os advogados dos oito réus no processo: Jair Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto.
Os oito réus fazem parte do chamado “núcleo crucial” — segundo a acusação, uma organização criminosa que teria tentado subverter o resultado das eleições de 2022, vencidas pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Todos negam as acusações.
Em sua manifestação no STF, o advogado de Bolsonaro, Celso Vilardi, disse que não “há uma única prova” que atrele o ex-presidente às tramas golpistas.
Crédito, Reuters
Segundo Celso Vilardi, não há provas que conectam Jair Bolsonaro aos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 e às demais manifestações públicas feitas por apoiadores em acampamentos em frente a quartéis pelo país.
O advogado de Bolsonaro também questionou a validade da delação de Mauro Cid e reclamou do grande volume de informações produzido na investigação e inserido nos autos do processo sem que houvesse tempo adequado para que a defesa analisasse esse material.
O advogado Paulo da Cunha Bueno, outro defensor de Bolsonaro, argumentou que a lei que criminaliza atos contra a democracia estabelece que deve haver atos violentos para que seja configurado o crime.
Segundo Bueno, a reunião de 7 de dezembro em que Bolsonaro discutiu com comandantes das Forças Armadas a decretação de Estado de Defesa ou de Sítio não pode ser considerado o início de um golpe de Estado por duas razões: porque essas ações estão previstas na Constituição e porque o então presidente não levou essas ideias adiante.
O advogado Matheus Milanez, que defende o general e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno, também criticou o que chamou de excesso de dados disponibilizados pelas autoridades à defesa às vésperas do depoimento de seu cliente.
Ele questionou a “postura ativa do ministro relator [Alexandre de Moraes] de investigar testemunhas”, ressaltando que Moraes fez 302 perguntas aos oito réus interrogados, enquanto a Procuradoria Geral da República fez 59.
“Ou seja, nós temos uma postura ativa do ministro relator de investigar testemunhas. Por que o Ministério Público não fez isso? Qual o papel do juiz julgador? Ou é um juiz inquisidor?”, questionou o advogado.
O advogado Andrew Fernandes Farias, do general Paulo Sergio Nogueira, disse que seu cliente tentou demover Bolsonaro de qualquer medida de exceção. O advogado afirmou que o general sofreu ataques virtuais para ser retirado do cargo, o que, segundo a defesa, seria uma prova de que ele é inocente.
O advogado José Luís Mendes de Oliveira Lima, do general Walter Braga Netto — candidato a vice de Bolsonaro nas eleições de 2022 —, afirmou que as provas apresentadas não mostram culpa de seu cliente e também que Braga Netto não teve exercício pleno ao direito de defesa, ao não ter tido tempo hábil para análise do processo e das provas nos autos, diante da quantidade “industrial” de documentos.
Lima criticou a delação de Mauro Cid, lendo diversos depoimentos dado pelo ex-ajudante de ordem.
Os advogados Jair Alves Pereira e Cezar Bitencourt, defensores do tenente-coronel Mauro Cid — ex-ajudante de ordens de Bolsonaro que se tornou delator no processo—, defenderam a validade do acordo de delação, dizendo que Cid não foi coagido a falar. Além disso, argumentaram que não há provas que mostrem que o tenente-coronel participou da tentativa de golpe.
“Ele não participou, não planejou, não mobilizou ninguém”, disse Bitencourt.
O advogado Paulo Renato Cintra — do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) — defendeu que as provas colhidas não atestam participação de Ramagem no plano de golpe.
O ex-senador Demóstenes Torres, advogado do almirante Almir Garnier, pediu a rescisão de delação de Mauro Cid e disse que o resultado do julgamento, independentemente de qual seja, “não vai permanecer”.
O advogado Eumar Roberto Novacki — de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro — tentou provar com um e-mail da companhia aérea Gol que seu cliente, então secretário de Segurança do Distrito Federal, estava nos EUA durante o 8 de janeiro por conta de uma viagem planejada com meses de antecedência.