Paula recebeu em 14 de agosto notificação extrajudicial para deixar a moradia ao lado do filho com deficiência

Paula Rutenia Bastos de Meira Fernandes, 34 anos, recebeu em 14 de agosto deste ano uma notificação extrajudicial para deixar, em três dias, a casa onde vive há sete anos. O comunicado é da Arquidiocese de Campo Grande, que reivindica a posse da área localizada no bairro Vila Morumbi.
Paula Rutenia Bastos, 34 anos, luta na Justiça para permanecer na casa onde vive há sete anos com o filho Arthur, de 6 anos, que possui deficiência. A Arquidiocese de Campo Grande reivindica a posse da área, localizada no bairro Vila Morumbi, e notificou a moradora para deixar o local em três dias. A mãe conseguiu uma decisão preliminar favorável, garantindo sua permanência temporária na residência. O caso aguarda manifestação do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, após a Arquidiocese recorrer da decisão. Parte do imóvel está em área pública municipal, enquanto outra porção invade terreno da instituição religiosa.
Separada do marido há cerca de um mês, Paula mora no local com o filho Arthur, de 6 anos, que tem deficiência. Desesperada, recorreu à Justiça para tentar manter a moradia, mesmo sabendo que se trata de área irregular.
“Se eu tivesse condições de ir para outro lugar, eu iria. Seria melhor do que passar por essa humilhação, porque é uma humilhação. Mas não tenho para onde ir, ainda mais sem família nenhuma aqui na cidade”, desabafa, com os olhos marejados.
Paula chegou a Campo Grande, vinda de Natal (RN), há quase oito anos, com o então marido. Descobriu a gravidez pouco antes da mudança e fez todo o pré-natal na Capital. Às 39 semanas, foi informada de que o bebê tinha cardiopatia grave e poderia morrer ao nascer. Desde então, Arthur passou por várias cirurgias cardíacas para melhorar a qualidade de vida.
Além da cardiopatia, o menino tem transtorno do espectro autista e faz acompanhamento em diversas terapias. Ele estuda na Associação Juliano Varela, onde a mãe buscou ajuda e conseguiu que o advogado da entidade, José Luiz Fernandes Varela, assumisse a defesa.
“Nós temos como provar que ela mora lá todo esse tempo. Só a conta de energia já tem mais de cinco anos”, disse o advogado. Ele acrescenta que parte da casa foi construída com recursos do BPC (Benefício de Prestação Continuada) da Loas (Lei Orgânica da Assistência Social), pagos de forma retroativa após atraso na concessão.
Na ação, Varela relata que o prazo para a saída foi exíguo e que, antes da notificação, houve ações “intimidatórias” da Arquidiocese e de seus representantes, como entrada de máquinas pesadas no entorno imediato da casa, invasão do quintal, marcação de árvores e ameaças verbais diárias.
Segundo ele, o ponto mais grave é que o uso de máquinas para desmatar parte da área provocou rachaduras nas paredes da casa, já precária. “Até então, nunca tinham aparecido”, afirma Paula, lembrando que outras famílias da região também receberam notificações. “Tem gente que já mora aqui há mais tempo que eu”, acrescenta.
Vitória temporária – Depois de ingressar na Justiça, Paula conseguiu decisão preliminar que garantiu sua permanência na casa, sob pena de multa à Arquidiocese. O entendimento foi de que, embora não comprovada formalmente, ficou presumida a posse superior a cinco anos. Para o juiz, a retirada imediata poderia causar prejuízo grave e de difícil reparação.
A Arquidiocese recorreu, argumentando que não houve “devida individualização da área invadida pela agravada, sem prova documental idônea que comprove posse justa e contínua”. Sustentou ainda que já começou a cercar o espaço e que há materiais de construção no local sujeitos a furto.
Na avaliação da defesa da entidade, a decisão “inviabiliza o exercício regular da posse pela legítima proprietária, impedindo-a, inclusive, de realizar atos de preservação ambiental, como aceiro acompanhado por fiscais municipais e cercamento”.

Parte da casa de Paula, entretanto, ocupa área pública que pertencia à União e está hoje sob domínio do município de Campo Grande. Outra parte invade terreno da Arquidiocese.
Em 11 de setembro, o desembargador João Maria Lós determinou que o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) se manifeste no processo. “Diante de possível prejuízo para as partes, bem como a fim de evitar nulidade futura, determino o encaminhamento dos autos à PGJ (Procuradoria-Geral de Justiça) para emissão de parecer”, decidiu.
A reportagem procurou o advogado da Arquidiocese, Danilo Augusto do Carmo Silva. Ele informou que apenas o padre Wagner Divino de Souza, administrador da entidade, poderia se pronunciar, mas adiantou que a instituição não costuma comentar processos judiciais. O padre deve retornar a Campo Grande na segunda-feira, quando poderá falar sobre o caso.
Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para acessar o canal do Campo Grande News e siga nossas redes sociais.