Prisão de Bolsonaro eleva pressão sobre Moraes no Congresso



A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de impor prisão domiciliar a Jair Bolsonaro (PL), nesta segunda-feira (4), intensificou a pressão nacional e internacional por uma reação do Congresso à sua atuação, vista pela oposição como autoritária e criminosa.

Aliados do ex-presidente reagiram à prisão com indignação nas redes sociais, entrevistas e pronunciamentos públicos. Eles classificaram o ato como “tirania judicial”, “silenciamento político” e “absurdo jurídico”. Nos bastidores, contudo, a decisão que agrava a crise institucional é tida como indutora da “tempestade perfeita” contra Moraes.

Ela combina o efeito arrasador da prisão de Bolsonaro, as tratativas frustradas do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para aliviar o tarifaço de Donald Trump, o protesto revigorado do povo no último domingo (3) e o temor de mais punições dos Estados Unidos contra autoridades, sobretudo contra um aparentemente STF dividido.

Para completar, surgiram novas revelações de arbitrariedades cometidas pelo ministro, em mensagens trocadas entre seus assessores que foram vazadas para a imprensa.

Membros da oposição e analistas revelaram à Gazeta do Povo que a decisão de Moraes contra Bolsonaro elevou tensões já instaladas nos três Poderes. A tempestade começou desde o anúncio de sobretaxas comerciais dos Estados Unidos ao Brasil e as sanções da Lei Magnitsky contra Moraes, como resposta à perseguição a Bolsonaro.

Oposição apresenta “pacote da pacificação” para salvar a democracia

Na retomada dos trabalhos do Congresso, nesta terça-feira (5), as primeiras manifestações couberam aos líderes da oposição e a dezenas de deputados e senadores de diferentes partidos, em favor da votação do impeachment de Moraes, da anistia aos réus do 8 de janeiro e do fim do foro privilegiado.

Os líderes prometem obstruir votações até que o “pacote da pacificação” seja aprovado. Para isso ainda contam com o protesto popular, e, sobretudo, novas medidas dos EUA, capazes de sensibilizar os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos‑PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União‑AP).

Como forma de mostrar convicção de que a oposição não irá recuar diante do bloqueio do comando da Câmara à anistia ao 8 de janeiro, o deputado Altineu Cortes (PL-RJ), vice-presidente da Casa, avisou que pautará o tema se Hugo Motta ausentar-se da Presidência, como ocorre em viagens oficiais.

A oposição ocupou simbolicamente e por tempo indeterminado as mesas da Câmara e do Senado para forçar uma postura de Motta e Alcolumbre favorável à busca de uma solução que, nas palavras do líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), pacifique o país e puna um “violador de direitos” – referência a Moraes.

Além dos mais de 30 pedidos de impeachment já protocolados no Senado contra Moraes e o apoio público de 38 senadores à sua abertura, a oposição aposta no agravamento dos cenários político, institucional e internacional como gatilho para uma reação mais ampla e efetiva do Congresso.

A avaliação é de que cresce o risco de “tempestade perfeita” contra o ministro, à medida que seu custo político se torna insustentável nos três Poderes. “Não há instituições, só tiranos com toga”, resumiu o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), para quem a prisão domiciliar de Bolsonaro é vingança.

Medo de novas sanções dos EUA pode quebrar resistências, diz oposição

O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), cobrou coerência da esquerda para apoiar a anistia, da qual foi amplamente beneficiada no passado. Já o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) acrescentou que “não é mais preciso esperar outras mortes e prisões injustas” para o Congresso agir.

Os gabinetes parlamentares avaliam que ainda podem surgir ações dos Estados Unidos para enfraquecer Moraes e viabilizar a reação do Congresso. No campo das sanções a autoridades, o STF tem vistos cancelados de ministros e familiares como possíveis alvos. Resta saber os riscos para Executivo e Legislativo.

Os EUA criticaram duramente a prisão de Bolsonaro, acusaram Moraes de silenciar a oposição e anunciaram responsabilizações contra quem apoiar a medida. Com o STF abalado pelas retaliações, há risco de o ministro perder ainda mais o apoio interno que cobrou na reabertura do Judiciário neste mês.

Outra preocupação emergente está no setor financeiro do país. Advogados avaliam riscos concretos de que sanções adicionais dos EUA afetem serviços e a estabilidade econômica nacional. A expectativa é de que o secretário de Estado, Marco Rubio, faça novas sinalizações de potenciais medidas.

Com isolamento crescente, Moraes conta apenas com real respaldo do Planalto

A se confirmar esse horizonte, Moraes só contaria hoje com efetivo apoio político do Palácio do Planalto, que por sua vez enfrenta crises na relação com o Congresso, baixa popularidade e crescentes desafios fiscais. Isso tudo apesar das notas de apoio ao ministro divulgadas pelos presidentes dos três Poderes.

A defesa institucional de Moraes ficou muito onerosa após Bolsonaro ser preso, segundo uma fonte do Senado que pediu para não ter o nome revelado. Antes disso, senadores reagiram a sanções impostas pelo ministro ao senador Marcos do Val (Podemos‑ES) – tornozeleira eletrônica e bloqueio bancário – e exigiram que o plenário anule as decisões.

A reação mais esperada pelos senadores de oposição à decisão de Moraes de prender Bolsonaro veio, contudo, dos Estados Unidos. Em comunicado publicado na segunda-feira (4), em inglês e português, o Departamento de Estado acusou o ministro de violar direitos humanos, prática pela qual já foi sancionado.

Para especialista, Lula precisa se afastar de Moraes para evitar danos ao país

O cientista político Leonardo Barreto, da consultoria Think Policy, observa que, se Moraes e o STF estão dispostos a “ver o mundo perecer” para punir Jair Bolsonaro, esse não é, contudo, o caminho do presidente Lula, cujo foco continua sendo o bem-estar de sua base eleitoral, de olho na reeleição.

A proposta de Lula de acionar a Advocacia-Geral da União (AGU) nos Estados Unidos para tentar reverter as sanções contra Moraes serviu, segundo Barreto, de recado sobre qual seria o limite da solidariedade do governo. “A intenção era limitar o desgaste e manter negociações econômicas com Trump”, diz.

Moraes quer mais. “Ele exige lealdade total do Palácio do Planalto, defesa explícita e retaliações diplomáticas, se necessário. Mas a demanda entra em choque direto com a estratégia do governo, apoiada pelo setor produtivo, de reduzir a tensão e isolar a questão tarifária da política”, explica Barreto.

A prisão de Bolsonaro na véspera da entrada em vigor do tarifaço é vista como erro que enterrou a chance de adiamentos ou alívios, tal qual sugere a nota do governo americano sobre a decisão de Moraes. “O pragmático Lula deve estar pensando em como soltar a mão do ministro”, opina Barreto.



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