De janeiro a julho, a Polícia Civil recebeu 548 denúncias desse tipo de perseguição, média de duas por dia
Mariana, de 45 anos, tenta superar uma rotina de medo e tensão que tem vivido. Foram meses de insônia, tristeza e sentimento de vulnerabilidade antes de decidir denunciar o homem que a estava perseguindo.
Mariana, de 45 anos, enfrentou meses de medo e insegurança após ser perseguida por um ex-companheiro, que invadiu seu celular e monitorou suas conversas, incluindo sessões de terapia. O caso, registrado em Mato Grosso do Sul, reflete um problema crescente: apenas nos primeiros sete meses deste ano, a Polícia Civil contabilizou 548 denúncias de perseguição. A vítima, que só se sentiu segura para denunciar em 2025, ainda vive sob ameaça, mesmo com medidas protetivas. Especialistas alertam que o medo pode paralisar as vítimas, mas ressaltam a importância de registrar ocorrências e preservar provas para garantir a investigação e a proteção legal.
O caso de Mariana não é uma exceção em Mato Grosso do Sul. Somente nos sete primeiros meses deste ano, a Polícia Civil já registrou 548 queixas de perseguição no Estado, uma média de duas por dia. No ano passado, o mesmo período registrou 657 ocorrências do tipo.
Ela acredita que tudo tenha começado em janeiro de 2021, quando recebeu uma mensagem no smartphone enviada por um “ex-ficante” com quem se relacionou há 20 anos. “Eu cliquei em um link de horóscopo. Creio que foi aquilo que permitiu o acesso ao meu celular”.
Vigilância on-line
A partir dali, o homem começou a ligar para Mariana com ironias e frases cifradas. As chamadas vinham cada vez de um número diferente. “No começo, eu não dava importância. Ficava brava, xingava e bloqueava toda chamada que recebia dele”, afirmou.
Em 2023, a situação se agravou. Foi quando a vítima descobriu que o homem monitorava todos os seus passos e conversas remotamente.
“Eu me senti paralisada e sozinha. Ele dizia que controlava o meu celular, que tinha acesso às minhas fotos, minhas conversas. Inclusive ele repetia coisas que eu havia falado em minha terapia”, comenta a vítima, visivelmente abalada.
Apesar de ter descoberto em 2023, Mariana só teve coragem de fazer a queixa em 2025. No início, sentia-se impotente, mas, aos poucos, tem se fortalecido e busca provar que o homem é o responsável pelos dias de terror que viveu e ainda vive.
Mesmo com a medida protetiva, ela teme ser surpreendida e encontrar seu perseguidor pelas ruas da Capital. Para manter a segurança da vítima, a reportagem trocou a identidade real por um nome fictício.
Bloqueio emocional
Especialista em atendimento de mulheres, a psicóloga Tatiana Samper afirma que o medo muitas vezes paralisa. “Podem vir alguns pensamentos associados ao medo, como o receio de que coisas muito ruins possam acontecer, caso ela venha a denunciar o seu stalker, ou até mesmo, a falta de entendimento de que aquilo é uma violação de direitos”, explica a psicóloga.
O que fazer em casos de perseguição digital
A Polícia Civil alerta que o primeiro passo para quem é vítima de stalking é registrar a ocorrência. Se o monitoramento ocorrer no âmbito de uma relação doméstica, familiar ou de afeto, a situação se enquadra na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006).
Nesses casos, a denúncia deve ser feita na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher da Capital ou nas unidades do interior. A vantagem de denunciar nesses locais é a possibilidade de solicitar medidas protetivas de urgência.
Para outras situações de perseguição que não se enquadrem na Lei Maria da Penha, a vítima pode procurar qualquer delegacia de área, delegacia municipal ou uma Depac (Delegacia de Pronto Atendimento Comunitário).
A Polícia Civil também orienta as vítimas a preservar todas as provas relacionadas aos atos. É fundamental guardar mensagens, e-mails, capturas de tela, números de telefone de chamadas anônimas e qualquer outra evidência de contato ou monitoramento indevido. O conjunto de provas é essencial para a investigação e para o andamento do processo.